quinta-feira, 19 de setembro de 2013

A bunda do Alceu

Uma manhã, o Alceu descia no elevador quando viu, pelo espelho da parede, que o vizinho do sétimo estava olhando para a sua bunda. Não havia dúvida, ele estava olhando mesmo. Era um olhar guloso, de quem queria aquela bunda. A bunda dele!

O vizinho não tinha como saber que Alceu o flagrara, o espelho ficava pendurado em cima da porta, num ângulo em que permitia a observação de quem se posicionava no lugar do Alceu e em nenhum outro ponto do elevador. Durante a lenta viagem até o térreo, portanto, Alceu pôde constatar como o outro admirava a sua bunda, uma admiração intensa, concentrada, quase apaixonada.

Alceu sentiu-se constrangido. Corou. Pensou em virar-se de frente para o outro e encará-lo, mas aí ele perceberia que tinha sido visto, e Alceu não queria que isso acontecesse. Afinal, já havia outras pessoas no elevador, inclusive a loira do quinto. Se ele se voltasse para encarar o vizinho do sétimo seria muito… homossexual… Não, Alceu não podia protestar. Mas sentia-se invadido por aquele olhar, sentia-se, sabe-se lá, violado.

O outro não parava de olhar. Olhava com vontade. Alceu pensou na própria bunda. Seria uma bunda feminina? Empinada? Até então, Alceu achava sua bunda normal. Uma bunda como todas as outras. Só que aquele olhar não era um olhar que se dedica a uma bunda normal. Teria Alceu engordado e sua bunda crescido? Estaria ele com um bundão? O que poderia significar isso? Será que outros homens cobiçavam sua bunda? E as mulheres?

Alceu estava perturbado. O elevador enfim chegou ao térreo, as pessoas começaram a se movimentar para sair. O vizinho do sétimo continuava olhando para sua bunda. Não parava de olhar. E, quando Alceu se moveu, o homem… suspirou. Ele suspirou de desejo pela bunda dele! Aquilo, a princípio, enfureceu Alceu. Por pouco ele não girou nos calcanhares, desferiu-lhe um tapa na cara e gritou:

_ Tarado!

Por pouco. Mas, depois, Alceu se conformou. Pensou: então minha bunda é bonita? Nunca havia pensado que uma parte do seu corpo podia ser desejada por outras pessoas. Uma bunda bonita, quem diria? Foi a vez de Alceu suspirar. Com o suspiro entre os dentes, saiu do elevador. E se foi pelo saguão do edifício. Rebolando.